Hospital foi escolhido pela excelência no tratamento de doenças raras
O Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) realizou a infusão do medicamento Elevidys, avaliado em 17 milhões de reais, em dois pacientes infantis, com diagnóstico de distrofia muscular de Duchenne. O Clínicas foi indicado pelo Ministério da Saúde para fazer o procedimento, via SUS, por ser um centro de referência no tratamento de doenças raras no país.
Os pacientes - ambos de 7 anos de idade - receberam a infusão nos dias 12 e 13 deste mês. A família de Joaquim Neves, de São Leopoldo, obteve autorização judicial para a compra do medicamento. O menino foi diagnosticado com a doença com um ano e 8 meses, e desde então faz acompanhamento com fisioterapeutas.”Não tinha nenhum medicamento que nos desse uma esperança de dar qualidade de vida pro nosso filho. E ele estava chegando em uma idade em que os sintomas seriam mais agressivos. Usar o Elevidys é uma escolha, porque é uma medicação nova, mas a gente fica feliz só de estabilizar os sintomas”, afirma. Já Heitor Fassina de Aguiar, de Sananduva (RS), iniciou o tratamento em São Paulo, mas pode fazer a infusão próximo de casa. “Fomos muito bem recepcionados, a equipe é maravilhosa e nos deu todo o suporte”, afirma a mãe, Luana Fassina de Aguiar.
Família de Joaquim e equipe médica acompanham a infusão
A Distrofia Muscular de Duchenne é uma doença genética rara, progressiva e incurável. Ela é causada pela falta de uma proteína nos músculos, que provoca pequenas rupturas (fibroses) toda a vez que a criança realiza um movimento, prejudicando atividades como caminhar e correr. O avanço da doença acaba comprometendo também as funções cardíaca e respiratória, limitando a sobrevida dos pacientes geralmente a no máximo 40 anos. O Elevidys usa um vírus modificado para levar o gene que produz a proteína faltante em uma forma similar ao de pessoas sem a doença até as fibras musculares, evitando novas rupturas. A expectativa é que o medicamento consiga estabilizar a progressão da doença, atrasando, por exemplo, a necessidade de cadeira de rodas. Comercializado pela farmacêutica Roche, o Elevidys foi aprovado pela (Anvisa) em dezembro passado. Mas o uso em larga escala ainda não é recomendado. Conforme o professor do Serviço de Genética Médica do HCPA Jonas Saute, as pesquisas deram apenas indicativos da eficácia do Elevidys. “Nem todos os parâmetros pesquisados tiveram resultado positivo, ainda há uma série de dúvidas. Além disso, os estudos realizados até agora mostraram eficácia e segurança em pacientes entre 4 e 7 anos, e não há pesquisas que sustentem o uso fora desta faixa etária ", explica.
Heitor e mãe, Luana
O passo a passo
Assim que foi contactado pelo Ministério da Saúde, várias equipes do Hospital de Clínicas de Porto Alegre iniciaram os preparativos para realizar o procedimento. Um ultrafreezer com temperatura de -80oC foi reservado para acondicionar os medicamentos, vindos da Alemanha. Para liberar o uso, foi necessário conferir os registros dos termômetros acoplados nas duas caixas, para receber o aval do fabricante.
A fabricante treinou os farmacêuticos que ficaram responsáveis pela diluição, preparo e manipulação, realizados numa sala especial da Central de Misturas Intravenosas (CMiv) do Serviço de Farmácia do HCPA, certificada para este trabalho. Depois de descongeladas e abertas, as ampolas precisavam ser utilizadas em até duas horas. Como a quantidade depende do peso da criança, foi preciso sincronizar o tempo entre o preparo e o início do procedimento.
A infusão foi realizada pela equipe da Enfermagem Pediátrica, de acordo com padrões internacionais de segurança do paciente e com o acompanhamento da equipe médica. Cada etapa do procedimento foi explicada aos pais pela enfermeira Tatiana Quevedo. Os pacientes receberam alta em 24 horas, mas vão seguir em acompanhamento semanal no HCPA pelos próximos três meses, para monitoramento dos efeitos adversos. “A gente fica muito orgulhoso de receber esses pacientes e contribuir com a sociedade. Principalmente com essas crianças que sofrem de uma doença que é grave, limitante, é uma oportunidade para retomar a qualidade de vida”, afirma o chefe do Serviço de Enfermagem Pediátrica, William Wegner.
Ultrafreezer armazenou o medicamento. Momento da infusão
O Clínicas e a terapia gênica
Mais de 100 famílias de portadores da distrofia muscular de Duchenne - uma das distrofias musculares mais frequentes na população - são acompanhadas atualmente pelo Clínicas. Além do tratamento dos pacientes, os familiares recebem aconselhamento genético, incluindo explicações sobre as implicações da doença sobre a saúde das mulheres portadoras, que possam auxiliar na tomada de decisões reprodutivas. A pesquisa em terapia gênica é uma das marcas do HCPA, que possui um Serviço de Genética Médica e um Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia voltado para a pesquisa das doenças raras (InRaras), bem como laboratório de células, tecidos e genes que realiza pesquisas em terapia gênica desde a primeira década dos anos 2000. Em 2022, o hospital foi o primeiro do país a aplicar a terapia gênica em uma paciente com Atrofia Muscular Espinhal (AME) no âmbito do SUS.
Médicos, enfermeiros e a família comemoram o procedimento